Primeiras palavras

"E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará" (Jo 8,32)

Apresentamos por meio dessa ferramenta um espaço para a reflexão sobre teologia, religiões e espiritualidade.
Aqui, você encontrará também material para a animação e formação da catequese, dos agentes de pastoral e para todos aqueles que querem aprofundar-se nos dados da fé. Enfim, propostas para uma pastoral verdadeiramente a serviço do Reino por gestos e palavras.
Paz e bem!

quinta-feira, 9 de julho de 2009

O PECADO (parte I)

Levar a termo uma discussão sobre o pecado em nossos dias é sem dúvida uma tarefa, no mínimo desafiadora, pois o conceito de pecado hoje vive um absurdo descrédito.
O aspecto objetivo do pecado, os mandamentos, sugere uma imposição de leis, fardos sem significado prático, e por isso, o cumprir a lei se torna uma obrigação rarefeita, sem sentido, obsoleta. Nesse sentido, o Concílio Vaticano II, tenta minimizar esse conceito pejorativo da prática da lei, e prima pela renovação do significado de cada um dos seus aspectos, a fim de que voltem a ser uma resposta de amor a Deus.
Devemos aqui apontar uma sensível dificuldade nesse trabalho: o tempo histórico. Antigamente percebemos que as normas morais foram incorporadas numa sociedade de comportamento moral homogêneo, com uma autoridade definida; havia uma unanimidade comportamental que obviamente oprimia e impedia o novo, assim essa sociedade era pouco exposta às mudanças, e isso referendava e legitimava determinadas normativas. Não havia contestação. Hoje, no entanto, é diferente. O mundo moderno pela sua pluralidade gera diferentes autoridades e influências e com isso, as referências de certo e errado divergem diametralmente, por isso não basta ditar a lei, é preciso justificá-la e dar a ela sua localização quanto ao grupo ideológico social.
Entendemos então, que não é a presença das normas que nos atrapalha, mas sim as diferentes normas e suas manifestações. Dessa forma, a Igreja e suas considerações sobre as normas morais é mais uma opinião no leque que compõe o quadro de opiniões no mundo moderno.
Os avanços da ciência e da técnica na contemporaneidade promovem , assim como a Igreja e o Estado etc, novas perguntas e novas soluções morais. Diante do novo, surge a dificuldade de determinar o “novo pecado", o "novo agir moral", a "nova concepção ética". Tudo tem que ser revisto, e deve-se discutir então se o pecado é subjetivo, objetivo, pessoal ou social, ou se ainda há outra concepção dessa realidade.
O relativismo do mundo moderno, o niilismo e o materialismo, acoplado às inovações técnicas e à nova ordem mundial, política e ideológica, reduzem as pessoas a simples e enormes “sacos sem fundo" que se movem pelo desejo de realizar-se tão somente. Nesse sentido, tudo se torna efêmero, assim a questão do agir moral, passa a se nortear também por essa compreensão de mundo. Algo é pecado na medida em que não obstrui o desejo de expandir-se e realizar-se. O pecado torna-se relativo e condicionado aos interesses do indivíduo, e assim, descredibilizado.
Chega-se a decretar a inexistência do pecado, mesmo diante da “sorte de desgraças" (guerra, fome, intolerância, corrupção, exploração e outros) que nos assolam. Por acaso essas situações não são a incontestável prova da existência do pecado? Observamos, concretamente hoje, o lucro, o desejo de satisfazer-se, de expandir-se, de realizar-se em detrimento da vida e da dignidade humana. Não seria isso pecado? O que aparece aos olhos da sociedade como caos social, aos olhos dos cristãos aparece como pecado, e esse desajuste social ou pecado, nada mais é do que o abandono do homem aos seus próprios desejos de expansão e de realização, configurando assim o grande tumor do ser humano.
No seu caráter pessoal, o pecado não está presente naquilo que externo, no rompimento da lei, da norma, mas em nós, internamente. E isso dá um certo trabalho para determinarmos, haja visto que temos que assumir que o mal está em nós e se concretiza em nossas ações destrutivas. Com um olhar corajoso para dentro de nós, observaremos que fazemos o mal. É a chamada concupsciência. Desejamos o bem, esse é o alvo, contudo, fazemos o mal e assim pecamos, erramos o alvo. “Não entendo, absolutamente, o que faço: pois não faço o que quero, faço o que aborreço" (Rm 7, 15).
Outro aspecto acerca da concreta existência do pecado é a própria história da Salvação humana. As Escrituras dão conta de um Deus que se lança sobre a humanidade em Amor e Perdão. Ele encarna isso! A título de que faria isso? A cruz é prova cabal do Amor e Perdão de Deus frente ao pecado do homem.
Por fim, no íntimo da humanidade existe o anseio do bem, nesse sentido, o indivíduo se torna ético. Ele ultrapassa as normas e represálias exteriores e busca em si, os caminhos para realizar-se no âmbito do bem. São as “Regras de Ouro". A partir dessa realidade, a culpa surge como falta, na medida em que o homem ao invés de abrir-se para o outro, para assim proceder para o bem, fecha-se e sufoca-se em seu mau desejo interior de realizar-se, daí a falta, o vazio, a culpa.
Diante do pecado e da culpa, surge um Deus que concretamente age na história, faz aliança, pacto de Amor e vida eterna. Permite-nos assim um relacionamento pessoal com Ele, plenitude de amizade. Por isso, a experiência do pecado é ignorar o Amor, desviando-se totalmente de Deus, não ouvir sua voz, nem atendê-lo; é o desejo de ser como Ele, ser senhor do bem e do mal. O pecado é, por assim dizer, a ruptura da aliança de amor, externada na lei, nos mandamentos e preceitos, que são muito mais que máximas para um comportamento moral, são constituição de identidade de todo o povo que faz uma concreta experiência do Deus-Amor. Toma dessa maneira, uma forma totalmente particular a lei e os mandamentos, pois transportam toda a carga de afetividade e compromisso concreto com Deus. “Sereis meu povo e serei seu Deus” (Ex 6,7). Entretanto nem sempre o povo manteve-se atento a isso, por isso a figura dos profetas no antigo testamento e do próprio Jesus nos evangelhos, para relembrar o amor e a presença de Deus.
Para aprofundar-se:
GAUDETTE, Pierre. O pecado. Ed. Ave Maria, São Paulo, 1997

Um comentário:

  1. Fico contente e radiante de esperança em um maior aprofundamento á esse blog. Parabéns Paulo, apreciei muito esse conteúdo. Devemos divulgar para que outros também tenham acesso à essas escritas.

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